Liberdade do Vento
Sinopse
Buscando quebrar paradigmas e com mudanças bruscas de expectativas, a história acompanha a narrativa de Magno após sua morte, em sua continuidade pelo Universo, vida após vida, guiado pelo elemento ar. Morte, vida, amores, poderes sobrenaturais, controle dos elementos, destinos cruzados, tudo isso está por trás dessa trajetória imprevisível. A Liberdade do Vento é o terceiro volume da saga Universo em Órbita.
Liberdade do Vento
Saga Universo em Órbita
Vol. III
Ciclo I
Eder B. Jr.
Literunico
Liberdade do Vento
Copyright © 2024 Eder B. Jr.
A mente engana quando enxerga apenas asas
Voar não depende só de recursos físicos
Poder não se faz apenas de armas
São rabiscos
Palavras, sonhos, desejos...
Lampejos
E o impossível se torna regra
A razão se torna cega
O amor vira tragédia
O inóspito novo abrigo?
Voar é pura entrega
É saltar sem ter espera
Mesmo tendo objetivos
Ou seríamos iludidos?
Sempre vale a pena o risco...
Capítulo 1
A Solidão da Independência
Uma vez escutei num sonho alguém me dizendo que a felicidade está dentro de nós mesmos e que nós a aprisionamos. Confesso que demorei muito tempo a entender o que isso significava e me atentei naquela ocasião, muito mais às curvas do corpo e a doce voz da bela mulher que pronunciou essa frase ao meu ouvido, em meus sonhos. Sempre quis encontrar essa mulher, achava que como num filme ela pudesse ser alguém de outra vida que surgiria a qualquer momento em minha frente me encantando repleta de enigmas como uma sereia.
Depois de ter sofrido alguns duros golpes da vida e de ter perdido um pouco da ingenuidade de criança e do romantismo apaixonado de adolescente, comecei a tentar procurar o que podia significar aquela frase de uma forma mais objetiva. Apesar de ter chegado a respostas bem satisfatórias, eu ainda sabia que faltava algo a ser descoberto.
Eu sentia que minha vida sempre me espreitava de longe, pronta para me apunhalar com golpes de espada e risadas soluçantes. Sentia-me um pássaro sem asas no meio de raposas selvagens. Não, eu nunca estava satisfeito. Eu sempre queria mais, mas não como os outros. Não queria mais do mundo pra mim, queria mais de mim pro mundo, mesmo olhando pros lados e não sentindo fazer parte daquilo tudo.
E durante as guerras que enfrentei, percebi que o mundo não se muda, as coisas são assim, começam e terminam dentro dos mesmos objetivos. A vida não é um desses objetivos. Quanto mais pessoas nascem, mais e mais a morte começa a ser um assunto corriqueiro, conversa de botequim, fofoca de donas de casa. A crise da fé, muito confundida com a religião, é um fator fundamental para tanto. O avanço científico fez com que os homens começassem a ter mais conhecimento do que não é verdade. Não conseguem jamais descobrir a verdade, pois provar a mentira se tornou muito mais simples. A sociedade vai se transformando em um amontoado de deformidades sem razão de existência.
Talvez por isso tudo tenha se banalizado e perdido o sentido. Talvez por esse motivo também ainda existam pessoas que se apegam no que eu escrevo, quando falo da relação entre prazer físico e sentimento, da diferença sutil entre desejo intenso e vulgarização. Quando escrevo contos eróticos, eu exporto meus sonhos e idealizações, mas eu vivo esses sonhos com tanta realidade que faço eles existirem de verdade na mente de quem lê. Na leitura, a gente sai do mundo de carne e osso e embarca dentro de nossa própria mente, num mundo criado por outra pessoa. O segredo do meu sucesso como escritor está na forma como eu permito que meus leitores gostem do que encontram em suas próprias mentes, mais do que do mundo real. Ou de como algumas coisas conseguem mudar a realidade e sair do imaginário, criar novas práticas, substituir antigos conceitos.
A praia é o lugar que mais me faz sentir o que escrevo e, por incrível que pareça, não é o barulho do mar que me causa essa sensação, mas a sua brisa, a forma como o ar se comporta em seu movimento. Parece que ele consegue saber o momento certo de ser suave e o momento certo de ser forte, o momento de te envolver e o momento de te jogar longe. Na praia, nada impede a ação do vento, ele se comporta de forma natural, sem barreiras. E tudo isso, por incrível que pareça, me faz pensar. Penso no comportamento das pessoas e em como elas usam sua sensualidade nesse ambiente. Observar nos permite, além de perceber coisas que jamais imaginaríamos, criar outras ainda mais inimagináveis.
E foi num dia como outro qualquer, ali sentado, analisando e sentindo a praia como de costume, poucas pessoas ao redor, que percebi uma mulher caminhando em direção ao mar, completamente vestida. Passos lentos, cabeça baixa, mãos trêmulas, não vi seus olhos, mas poderia jurar que estavam em lágrimas. Fiquei preocupado a cada vez que ela se aprofundava mais. Quando, num momento, ela sumiu, confirmei minhas suspeitas. Ela pretendia o suicídio. Saí correndo em direção a ela.
O mar estava revolto, as ondas ficando cada vez mais altas e as águas com uma força incrível dificultavam muito minha chegada até aquele ponto. Eu não conseguia mais vê-la, mergulhava e voltava procurando, mas não a encontrava. Um salva-vidas que me viu correr veio atrás, e ficamos desesperadamente tentando localizá-la. A maré subiu muito rápido, e quando já estávamos quase sem esperanças, eu senti algo tocar minhas pernas. Mergulhei, e ali estava ela. Agarrei-a junto ao meu corpo e, com a ajuda do salva-vidas, a trouxemos de volta à areia.
Fiz o procedimento de ressuscitação, mas ela não demonstrava reação. O salva-vidas assumiu meu lugar, continuou nas tentativas, enquanto eu fui buscar socorro. Já era tarde! Ela não ia mais acordar... Como pode? Uma mulher linda, que parecia tão cheia de vida... O que teria feito ela colocar fim à própria existência? Se eu tivesse me antecipado... se tivesse tomado a atitude de seguir meu instinto, minha intuição do que ela pretendia fazer... Infelizmente, o "se" não existe e o tempo não volta.
Aquela noite, eu não dormi, lembrando cada detalhe do que aconteceu, cada movimento, tentando entender os motivos. Ela não tinha documentos, identificação nenhuma, nada que pudesse dar resposta a todas aquelas perguntas. Resolvi levantar no meio da madrugada e sair. Fui até um bar, pois nos momentos de inquietação a gente tende a acreditar que o álcool pode ampliar nossos horizontes sobre coisas impossíveis de entender ou aliviar a dor de não saber o porquê.
Depois de algumas doses de vodka com gelo e limão, eu só pensava no olhar daquela mulher que eu não cheguei a conseguir ver. Eu sempre considerei o olhar de uma pessoa o reflexo da sua alma, e eu não consegui conhecer aquela alma. Não conseguia me conformar com isso, como aquela vida esteve em minhas mãos, e eu não consegui nem olhar em seus olhos.
Quando percebi que meus pensamentos iriam me obrigar a puxar um papel e uma caneta, notei um desentendimento acontecendo ao meu lado em uma mesa. Um homem muito alterado flagrou sua mulher ali aos beijos com outro homem. As pessoas tentavam contê-lo, mas ele estava fora de si. Gritava a ponto das veias de seu pescoço quase atravessarem sua pele, as palavras que ele usava para ferir parecia que estavam cada vez mais machucando a ele mesmo. Muitos tentavam controlá-lo, mas ele era muito forte e derrubava quem vinha pela frente. Pegou a moça pelo pescoço e a ergueu, olhou para sua expressão de desespero e a soltou. Gostava demais dela para machucá-la. Então, voltou-se para o rapaz, que desesperado se ergueu e apontou uma arma para ele. Todos ficaram imóveis, e o barulho de toda aquela bagunça silenciou por alguns segundos eternos. Quando o homem traído partiu para cima da arma com uma voadora, o tiro ecoou pelo bar, e, após o atirador ser dominado, todos procuravam ver se alguém estava ferido, onde a bala tinha acertado...
Eu não percebi, não senti dor... só vi quando abaixei a cabeça e percebi minha camisa branca se tornar vermelha de sangue. Fui sentindo muito frio e um desespero de quem perdeu o controle dos movimentos. Todo mundo correndo em minha direção, e eu caí.
Lembrei da minha mãe, da minha família, dos amigos, sim, eu vi minha vida toda passar em flashes. E minha independência, que lutei tanto para conquistar, naquele momento era minha total solidão. Eu sabia que não tinha jeito mais. O tiro tinha sido no coração, eram poucos segundos para a morte. Ninguém iria vir, nem família, nem meus fãs, nem a mulher dos meus sonhos que nunca viraram realidade. O meu adeus não teria dono!
Capítulo 2
O Despertar da Morte
O vento poderoso me arrastava em seu turbilhão, lançando-me através do vazio infinito. Era como se meu corpo fosse apenas um fragmento solto no universo, sem controle sobre minha própria existência. A paisagem à minha volta era composta por uma vastidão branca, reminiscente de nuvens em constante movimento, que pareciam sussurrar segredos ancestrais em seus redemoinhos. O ar violento chicoteava meu rosto, deixando uma sensação de formigamento na pele.
Em meio àquele caos cósmico, comecei a questionar minha própria condição. Será que eu morri? Estaria vagando pelos confins do além? No entanto, minha consciência ainda estava intacta, meu corpo pulsava com vida e não havia sinais de ferimentos. A queda iminente, que se aproximava rapidamente, despertou uma angústia sufocante dentro de mim. Era como se estivesse prestes a ser lançado em direção à destruição, um corpo celeste ardendo em chamas enquanto rasgava o firmamento. E então, no ápice dessa tensão, colidi com o chão numa explosão de dor. Meu grito ecoou no vazio em um sinistro murmúrio de desespero.
A dor queimava em cada fibra do meu ser, enquanto eu me contorcia no solo áspero. Minha mente lutava para assimilar aquela experiência surreal. Levantei-me lentamente, amparando-me na força de um corpo que parecia ter sido feito de aço. Surpreendentemente, apesar do impacto brutal, não havia sofrido nenhum dano grave. Apenas algumas rachaduras se espalhavam pelo solo, testemunhas silenciosas do choque violento.
Contudo, o lugar onde eu estava despertava ainda mais interrogações. Diante de mim se estendia um deserto vasto e imponente, com um horizonte indistinguível. O chão, liso como cimento, parecia estender-se até o infinito. Uma ventania feroz varria a paisagem, levantando redemoinhos de areia em seu rastro. Era um cenário desolado e misterioso, desprovido de vida e de qualquer indício de civilização.
A sensação de isolamento e incerteza começou a me envolver. Onde eu estava? Aquilo seria uma espécie de julgamento, um portal entre o céu e o inferno? Nada naquele ambiente árido e desconcertante se assemelhava ao que eu imaginava como o paraíso ou o inferno, convencionais.
Antes que eu pudesse encontrar uma resposta para aquele enigma, fui surpreendido pelo aparecimento de um homem à minha frente. Ele emergiu da ventania, pousando no chão com uma graça que contrastava com a minha desajeitada queda anterior. Seus cabelos e barba grisalhos conferiam-lhe uma aparência sábia e venerável, e seus olhos exibiam um brilho enigmático. Era como se ele fosse um guardião desse lugar misterioso.
— Seja bem-vindo, como te chamas? — Indagou ele com uma voz calma e profunda.
Ainda desnorteado, respondi:
— Não sei muito mais de nada. Se minha memória não me engana, meu nome é Magno.
O homem, que se apresentou como Nazerith, parecia compreender minha confusão, mas também reconhecer meu progresso em aceitar a partida da minha vida anterior. Ele explicou que eu havia realmente morrido e renascido em um novo mundo, carregando minhas memórias e com um amadurecimento espiritual que determinava minha nova aparência física, representada pela minha "idade". No entanto, Nazerith adiantou que havia muito mais a ser compreendido, e me convidou a acompanhá-lo.
Desafiando novamente a força do vento, fui levado em seu turbilhão, caindo mais uma vez no solo impiedoso. A dor ressurgiu, inclemente, porém encontrei forças para me erguer mais rapidamente, dessa vez. À minha frente, revelou-se uma visão de tirar o fôlego. Era um lugar magnífico, que transcendia qualquer concepção terrena do paraíso. Prédios majestosos, com uma arquitetura de beleza inigualável, flutuavam como se desafiassem a gravidade. Suas estruturas pareciam vibrar com uma energia transcendental, e as cores predominantes eram brancas e cinzas, em harmonia e um certo contraste com o ambiente celestial que se estendia diante de mim.
Uma praça central se destacava, adornada por um chafariz que parecia conjurar ventos e mudar de forma em uma dança fluida. Atrás dela um prédio flutuante, o único que não tinha nenhuma ligação com o chão. Seu acesso só podia ser realizado através de um local demarcado onde o vento transportava a pessoa até sua entrada.
Nazerith então sugeriu que continuássemos nossa jornada, adentrando o prédio flutuante que se destacava na paisagem. Para chegar até lá, tínhamos que enfrentar uma caminhada sob a estrutura, uma experiência intimidadora e enigmática. Enquanto andávamos, eu sentia o peso daquele imenso edifício flutuante pairando sobre mim, criando um senso de opressão e grandiosidade. Minha mente se enchia de questionamentos sobre o que me aguardava além daquelas portas.
Entramos, carregados pelo vento os sons da ventania se misturavam a murmúrios indistintos. Ao entrar, logo percebi que as pessoas lá dentro se dedicavam a diversas atividades. Alguns treinavam uma espécie de luta de ventos, desafiando as correntes furiosas em uma espécie de balé mortal. Outros permaneciam imóveis, em um estado de contemplação e meditação profunda. Tanta coisa pra se ver ao mesmo tempo que não sabia distinguir o que acontecia. O espaço não parecia ter limites, aparentemente estávamos num local a céu aberto e não num prédio. Não havia salas, não se via paredes, a gravidade parecia nem existir.
Curioso e maravilhado, perguntei a Nazerith se aquele lugar era uma escola. Ele sorriu enigmaticamente e explicou que aquele era um espaço conhecido como Zona Livre, onde o aprendizado e a prática de exercícios eram realizados. No entanto, ele revelou que essas áreas haviam sido construídas durante tempos passados de guerra, protegidas pelos poderosos Reis do Vento. Eram estruturas indestrutíveis, destinadas ao desenvolvimento e aprimoramento espiritual. Nazerith me olha e, vendo que não entendi muito bem tudo aquilo, tenta me tranquilizar:
— Tudo bem, tire essa cara de quem viu uma equação matemática pela primeira vez. Vou te explicar agora um pouco do que você precisa saber para começar a entender melhor as coisas.
Mas uma fome voraz começou a se manifestar dentro de mim com intensidade insuportável.
— Antes de mais nada, preciso comer alguma coisa, estou sentindo uma fome absurda. Tem algum fast food por aqui? O que vocês comem? — Perguntei inocentemente. Realmente eu estava com uma fome que jamais senti antes, o estômago saindo pela boca.
Nazerith riu, dessa vez um riso estrondoso e quase sobrenatural, chamando a atenção de todos ao nosso redor. Em meio às gargalhadas, ele me advertiu que meu apetite voraz só aumentaria quanto mais eu resistisse à busca pelo conhecimento. Ele me explicou que, como habitante do Planeta dos Ventos, eu me alimentava de conhecimento e que quanto mais aprendesse, mais energia meu cérebro geraria para sustentar meu corpo. Era uma simbiose extraordinária, onde meu cérebro absorvia as moléculas de ar e as transformava em alimento e água.
Aquele conhecimento era como uma refeição para mim, e eu ansiava por mais. Compreendi que aquele lugar era um ambiente de aprendizado constante, onde as pessoas se alimentavam de sabedoria para nutrir sua existência. Era um banquete para a mente e o espírito.
— Por isso então tanta gente está aqui aprendendo, treinando, se aprimorando? Achei que tinha muita gente aqui mesmo para um povo que não está em guerra há muito tempo.
— As coisas começaram a fazer sentido pra mim.
— Exatamente. Dizem os sábios que os renascidos no vento são os mais temidos pelo Universo, os que nunca são desafiados, pois nos alimentamos de conhecimento e de técnica. As lendas contam que o próprio Criador sempre foi mais propenso ao elemento ar. Mas são apenas boatos. Os Reis do Vento dizem que ainda estamos nesse mundo muito limitados e não conhecemos muitos dos elementos existentes no universo. Agora vamos, será muito importante que você se alimente mais, imagino que irá se surpreender mais ali à frente.
O suspense envolvia cada passo que dávamos, o mistério daquele lugar desconhecido pulsando no ar. O som do vento parecia carregar toda informação do Universo, sussurrando enigmas e desafios a serem desvendados. A curiosidade e a ansiedade se misturavam dentro de mim, formando uma expectativa eletrizante para o que estava por vir.
Capítulo 3
O Pequeno Rei do Vento
O garoto corria enquanto correntes de ar passavam por sua cabeça e as rajadas, em um vai e vem, indicavam que os guerreiros do vento procuravam por ele
Ele era esperto, sabia que podia ir mais rápido, que podia flutuar, voar, tentar ir pra longe num pensamento, mas preferiu ser cauteloso e não usar suas técnicas, ficando assim o mais escondido possível.
Sua mente voltava a um passado recente:
— Filho, sabe qual é nossa maior fraqueza, nosso único ponto fraco? — Era a voz suave do Rei Falcão que falava com o pequeno príncipe.
— Não consigo imaginar que nosso povo tenha fraquezas, meu pai — respondeu o garoto, muito seguro de si.
— Então, meu filho, essa é uma das nossas fraquezas, nosso excesso de confiança, nossa incapacidade de perceber que qualquer ser do universo é como uma balança e não existem características que não tenham alguma compensação, algum ponto negativo ou positivo. O Universo, Henrique, foi feito para se equilibrar e harmonizar, quando uma força desequilibra a balança, outra surge para colocar as coisas no seu devido lugar. Dessa forma nada é invencível, nada é indestrutível e nós não vivemos pra sempre do mesmo jeito. Olhe no horizonte, Henri... — Deslizou com as mãos, o Rei e trouxe com ela o campo de visão da sacada do palácio. Lá era um dos poucos pontos do planeta com visão privilegiada, acompanhando os desertos de carbono e as florestas de hidrogênio.
— Veja meu filho, como trabalhamos para que essa nossa casa fosse harmoniosa, para que não tivéssemos guerras, nem entre nós mesmos, nem com outros povos. Aprendemos a viver assim. Mas temos que tomar cuidado com nossas decisões para o futuro. Em alguns momentos, mesmo sabendo que podemos ir longe, que temos poder para mais e mais, precisamos ir devagar, ser suaves, como uma leve brisa, diminuir o ritmo. Nenhuma ação deve ser realizada sem um planejamento. — Olhou para o filho que estava completamente hipnotizado pelas palavras do pai e voltou a questioná-lo:
— Mas te perguntei, então, nossa maior fraqueza e te respondo: Nossas habilidades requerem movimentos rápidos e nossos movimentos deixam marcas. Os nossos mais fortes guerreiros também são aqueles mais facilmente evitáveis, pois anunciam sua chegada com o movimento que causam no ar. Se um dia precisar se esconder, se um dia nossa paz acabar e eu não puder te proteger mais, você deve saber o que fazer. O vento não deve ser jamais combatido, o vento deve ser evitado. Portanto para enfrentar guerreiros de vento, você deve não usar o vento, mas sim ser indetectável, deve deixar o vento passar.
O pai muito provavelmente já previa o que estava por vir.
O garoto ainda estava abalado pela passagem para outro mundo de seu criador, assassinado na sua frente, mas ele precisava ser forte agora mais do que nunca, seguir os ensinamentos do soberano e deixar o vento acabar. Não podia acreditar que o General-Maior do Vento pudesse trair seu Rei. Precisava procurar alguém que pudesse lhe guiar, dar respostas. Esse alguém em sua cabeça só poderia ser o velho ancião da floresta de hidrogênio.
Precisava saber o que fazer pois muitos que ajudaram em sua fuga ainda corriam perigo no palácio, não podia ficar muito tempo se esgueirando pelas frondosas árvores. Mas tinha que continuar sendo cuidadoso e não criar túneis de vento para voar.
Pensava na sua ama que conseguiu colocá-lo em uma máquina de energia, para que ele pudesse ser atirado pela bomba de ar e assim fugir. A essa altura, ela já poderia ter sido descoberta por ter ajudado o garoto. Teria ela feito a passagem pra outro mundo como seu pai?
E sua mãe que ainda estava nos círculos estelares das águas e ainda não sabia de nada o que acontecera?
De repente uma corrente de vento o acertou, todo o caminho que ele tinha feito começou a ser aberto entre as árvores. Ele seria encontrado. Pensou rápido e começou a fazer os movimentos que tinha treinado de oclusão, força do vento contrária no centro do túnel de vento e com a outra mão força equivalente a favor do vento que o atingia. Pressionou os pés na terra de forma bem firme e lutou com todas as suas forças para permanecer no lugar. Logo sentiu o vento diminuir e ele também foi parando, já quando estava quase sem forças. O guerreiro não o percebeu ali, a noite não o revelou. Jamais um soldado poderia imaginar que um garoto poderia permanecer no chão recebendo uma rajada de vento. Mas a equipe de busca continuava procurando por ele. Quando já estava quase sem energia para continuar, pensando em desistir, começou a ouvir passos se aproximarem. Será que um guerreiro decidiu fazer a busca no solo? Ele sabia que já não tinha como lançar qualquer técnica de vento então quando viu a sombra se aproximar não pensou duas vezes e disparou um soco.
O velho atingido pulava como um macaco entre os galhos, murmurava uns gemidos de dor, provavelmente por não querer chamar a atenção.
— Moleque! Você quase quebrou meu nariz, seu fedelho! E eu aqui querendo te ajudar! — Disse o velho quase que num ritual de “amaldiçoamento”.
— Senhor Ancião, me desculpe, não podia imaginar, achei que fosse um dos soldados que estão me perseguindo —respondeu o príncipe.
— Tudo bem, tudo bem, vamos, minha cabana está logo ali! — Apontou o velho, que ainda esfregava o nariz com movimentos que pareciam machucar mais do que o próprio soco.
Andando mais um pouco o velho apontou um buraco próximo a uma árvore e disse:
— É ali!
— Só estou vendo um buraco! — Questionou, cético, o garoto.
— Esses jovens nunca sabem que as coisas nem sempre são o que parecem... — Lamentou o velho empurrando o garoto no buraco.
Ele até tentou evitar, mas o buraco o puxou e ele começou a cair em algo que parecia um poço sem fim, muito escuro. Até que, com um estalo, ele teve a queda diminuída por uma rajada de ar e foi colocado em pé, no fundo do poço escuro, em seguida o velho chegou junto dele.
— Acenda! — Disse o velho e então, o que parecia o fundo de um poço se iluminou como um casarão enorme feito de algo que parecia madeira. A sala tinha uma lareira e algumas poltronas flutuantes, uma escada levava para outros cômodos.
— Que lugar incrível — Constatou o príncipe.
— Bem-vindo à minha cabana, oh, Pequeno Rei do Vento! — Recepcionou o ancião com meio sorriso no rosto.
Capítulo 4
Tempos de Guerra, Povo de Paz
A quantidade de vezes que eu coçava a cabeça, como um tique, cada vez que eu ficava assombrado ou que não compreendia alguma coisa, já era incontável.
Tudo me surpreendia, cada mínimo detalhe. A forma como todos se organizavam, se mantinham em ordem, se respeitavam acima de tudo, era o que mais chamava minha atenção, talvez a principal diferença daquele lugar em comparação com a Terra. Era algo que eu não conseguia explicar exatamente. Todos eram cordiais uns com os outros, gentis, pacientes. A sensação que dava era que todos sentiam que tinham todo tempo do mundo, que não havia motivo para brigar ou para sempre querer mais pra si mesmo, aquela exigência de prioridade que eu vi tanto nas pessoas na minha outra vida.
Nazerith me explicava um pouco mais sobre o funcionamento daquele planeta. Sua sociedade se auto geria. Não existia um governo, apesar de existir um rei. As pessoas analisavam as necessidades de suas comunidades e apresentavam propostas aos seus semelhantes, as melhores ideias escolhidas ganhavam o direito de serem executadas. As moedas de trocas eram livros. Pequenos cartões que, apertados, se transformavam em páginas tridimensionais. O conteúdo semelhante ao que me era familiar: palavras escritas com o objetivo de transferir conhecimento e/ou divertimento.
Portanto a noção de riqueza era muito relativa. Talvez para Nazerith, não seria interessante fazer negócio com Eviah pois este, pelo que ele falou, não possuía nenhum livro que Nazerith já não tivesse lido. Em contrapartida, se comparado comigo ou com outros iniciantes, sua coleção poderia equivaler a algo que eu consideraria como milionário. O poder dessa forma estava nas mãos dos que possuíam maior conhecimento, mas estes por sua vez não se utilizavam desse poder como forma de dominação. A sociedade era harmônica, pois todos aprenderam a dividir conhecimento e trabalho uns com os outros e esses dois fatores eram muito valorizados entre eles.
— E o Rei? Se a sociedade consegue ser harmônica e não depende de ninguém para controlá-la, por que existe um rei? — Foi minha pergunta lógica.
— Nem sempre nossa sociedade foi como é e se chegamos nesse estágio, muito se deve a posição do nosso soberano. Ele é o detentor do maior conhecimento dentre todos nós e foi ele mesmo quem abriu mão desse tal controle sobre a sociedade. Ele se tornou um orientador, um guia para nós. Nunca se impôs para conseguir o que achava certo, muito pelo contrário, sempre nos convenceu, nos fazendo entender o que era melhor. — Conseguia ver a admiração nos olhos de Nazerith.
De repente uma sirene começou a tocar. Aquela tranquilidade que nos cercava se tornou estranheza e agitação. Todos começaram a se dirigir para as saídas.
— O que é essa sirene? — Questionei Nazerith.
— É o chamado de emergência do Rei. Quando essa sirene toca, devemos nos reunir nas praças centrais das cidades e aguardar instruções. — Ele me respondeu bastante preocupado e ofegante, enquanto saímos também.
— E por que todos estão tão preocupados, isso é normal não é? — Perguntei com a esperança de uma resposta que me tranquilizasse.
— Somente os mais antigos já ouviram esse sinal. Foi quando o Rei assumiu seu reinado e quando começaram nossos tempos de paz, isso já tem alguns séculos.
A resposta do velho não foi como eu esperava. Será que o problema era comigo? Foi só eu chegar que a paz centenária do lugar acabou? Bom, "que a aventura comecem, então", era o que eu conseguia pensar.
Todos se reuniram na praça central. Milhares de pessoas. Pelo que entendi em outras cidades, todos fizeram o mesmo. Nós estávamos na capital e o Rei apareceria ali mesmo a qualquer momento. Nos outros locais sua imagem aparecia de maneira holográfica, como se ele estivesse lá.
Então ao invés do Rei alguns soldados desceram voando até o círculo central.
— Aquele é o general César. Ele manteve o exército treinando técnicas do vento por gerações, dizendo ao Rei que era necessário que tivéssemos alguma proteção, se um dia voltássemos a um cenário de guerra. O Rei concordou, mesmo não gostando da ideia, por achar que a população se sentiria mais segura.
Quando olhei para o general percebi que ele brilhava. Era como se uma áurea fizesse um contorno em seu corpo e eu praticamente não conseguia ver outras pessoas ao seu lado.
— E esse general, ele brilha mesmo daquele jeito? — Perguntei intrigado.
— Você está enxergando-o brilhante? Como se ele se destacasse dos outros? — Nazerith perguntou ainda mais intrigado que eu e respondi que sim com a cabeça. — Magno, nós só enxergamos dessa forma pessoas com a mesma descendência que nós, família de sangue. O sangue é um rastro que jamais se perde no universo e nosso corpo sempre encontra uma forma de identificar esses traços. Aqui é o sentido da visão que indica isso.
— Isso significa... — Gaguejei chegando a conclusão, mas Nazerith me interrompeu:
— Significa que você é descendente direto do general, significa também que ele veio da Terra e que ele mentiu sobre isso...
— Povo do Vento sob o Segundo Sol, amados irmãos, é com muito pesar que venho aqui dar duas notícias devastadoras. — Começou a falar o general e todos emudeceram. — Tenho a difícil missão de comunicar-vos que nosso rei foi assassinado.
A multidão entrou em pânico. Era difícil entender todo aquele desespero, sendo que eles sabiam que a alma tinha continuidade, que o rei então só tinha feito uma passagem para outro mundo.
— Sei o que você está pensando, Magno. — Nazerith se antecipando e me explicando a situação, como se tivesse lido meus pensamentos. — Não existe assassinatos no nosso mundo. No nosso planeta não é possível reencarnar assassinos, qualquer um que já tenha tirado a vida de outra pessoa jamais esteve no universo do segundo Sol, nunca alguém tirou a vida de alguém aqui. Como também pode perceber, não é todo dia que recebemos novos encarnados. Nosso planeta não abriga uma grande quantidade de recebimentos pois não temos óbitos.
Então, comecei a entender um pouco mais a aflição de todos.
— Isso significa que os tempos de guerra estão voltando. Que outros chegaram a nossa terra novamente depois de séculos. — Nazerith refletia catatônico com a notícia.
— Meus irmãos! — Gritou o general. — Nosso rei permitiu que ainda tivéssemos um exército para que se um dia isso acontecesse, estivéssemos preparados. Ele não nos deixou desamparados. Estou aqui para garantir que somos mais fortes do que antes e estamos prontos para qualquer invasão. — O general era imponente, firme, conseguia demonstrar segurança àquele povo. — Nós já sabemos quem ousou nos desafiar...
Todos se calaram.
— Nós recebemos um intruso do povo do fogo do quarto Sol do universo 4.
O pânico agora era muito maior, quase como a notícia do apocalipse. As pessoas gritavam desesperavas, alguns choravam.
— É impossível que o povo do fogo quisesse atacar nosso planeta, por mais que eles nos destruíssem as consequências para eles seriam terríveis. Pelas regras básicas do universo os povos não podem atacar outros planetas de níveis inferiores. Os mestres do vento teriam abertura para intervir nessa guerra e ela seria uma guerra universal. Mas o povo do fogo não conseguiria vencer. Ninguém pode vencer os mestres do vento. Isso está errado, isso com certeza está errado... — Nazerith murmurava seus pensamentos, suas teorias.
Um grito no meio do povo foi alto o suficiente para que o general ouvisse.
— Eles podem se teletransportar?
Parece que todos estavam com essa mesma dúvida e pararam para ouvir.
— Ao que tudo indica o plano de matar nosso rei foi o primeiro teste da técnica de teletransporte deles. Nunca antes alguém de nível 4 conseguiu se teletransportar para um planeta de nível inferior. Nós capturamos o assassino, mas ele não fala, não temos poder para subjuga-lo nem para mata-lo. Mas nosso rei tinha uma prisão de água, de uma antiga conquista que ele teve. Nós o prendemos e de lá ele não pode sair mais. Mas não sabemos se outros virão.
Ninguém parecia acreditar em tudo aquilo. Tempos de guerra jamais deveriam atormentar um povo de paz.
— Bom, tenho outra notícia. O pequeno príncipe fugiu para as florestas do vento. Estamos tentando localiza-lo, mas ainda não tivemos sucesso pois ele não está usando técnicas de vento. Deve estar tentando se proteger, acreditando que pode estar sendo perseguido ainda pelo assassino do pai. — O general fez uma pequena pausa e voltou a um tom mais pesado do início da conversa, quando passava segurança para todos — Meu povo, nessa situação gostaria de declarar que tomei a decisão de me autonomear Regente do Vento do Segundo Sol do Universo 2.
Os soldados se ajoelharam e todo resto do povo foi fazendo o mesmo num efeito dominó.
Nazerith perplexo ainda parecia indeciso sobre ajoelhar ou não. Eu fiquei na mesma indecisão.
— Se ele mentiu sobre não ser da Terra, sobre o que mais ele poderia mentir? — Balbuciou o velho.
Nesse momento, com a multidão caindo de joelhos aos pés de seu novo rei temporário, ele conseguiu ver Nazerith e logo me viu também. Muito provavelmente me percebeu brilhante, assim como eu o via.
Ele chamou um soldado próximo a ele, pedindo que se levantasse, me apontou e o soldado começou a vir em minha direção.
— Magno, corra, corra muito e não pare! Vá sentido a torre leste, ali — apontou com o dedo para a tal torre — lá você verá a floresta. É pra lá que você tem que ir. — Nazerith me empurrava, eu confuso perguntei:
— E quando eu chegar lá, o que faço?
— Confie em mim... Corra! Se encontrar alguém parecido comigo, confie nele! — Gritou, se perdendo também no meio da multidão.
— Traidor, peguem o traidor! — Gritou o general apontando para mim.
Eu já estava saindo do meio da multidão, percebi uma entrada, algo como se fosse um bueiro. Abri e pulei sem nem imaginar o que havia dentro. Foi o tempo de escutar uma voz:
— Ele foi pela saída de escape de vento dos guerreiros. Nós o perdemos...
Capítulo 5
A Floresta
Eu já não sabia se pular naquele buraco tinha sido uma boa ideia. Comecei a cair num tobogã de vento. Não tinha paredes, mas o ar pressionava meu corpo e me carregava, cada hora para um lado, num imenso vazio. Parecia um poço sem fundo. Passei a ter a sensação de que ficaria preso ali para sempre. Um desespero começou a tomar conta de mim. Quanto mais nervoso eu ficava, mais rápido o vento me levava e mais pressão o ar fazia contra meu corpo. Comecei a pensar o que o velho diria para mim naquele momento: "Se concentre, fique calmo, sinta o que está acontecendo a sua volta.”
Fechei os olhos, já que não enxergava por conta da escuridão, respirei bem fundo e comecei a prestar atenção em como o vento agia contra meu corpo, ele se chocava, ora sobre minha cabeça, ora por meus pés e isso me virava de um lado para o outro.
Aos poucos comecei a sentir como se fizesse parte dele. O ar se movia e meus membros pareciam se tornar o próprio ar, até que em um movimento que fiz, o vento seguiu a direção que eu quis. Na primeira vez, isso abriu caminho sob meus pés e minha queda acelerou ainda mais. Na rajada de vento que se seguiu eu rodei meus braços e a velocidade da minha queda começou a diminuir. Era como se eu começasse a flutuar, a voar. Uma enorme força agia para cima, contra a gravidade, me mantendo no mesmo lugar. Até que eu já não sentia mais força nenhuma, era como se o ar a minha volta e meu corpo tivessem se tornado uma coisa só. E a escuridão, então, se dissipou e eu pude ver o chão se aproximando. Consegui descer com tranquilidade, como se estivesse pousando uma nave, tocando levemente meus pés no chão. Quando comecei a andar, percebi que eu estava em algo que parecia um labirinto. Tentei voar usando a técnica que havia acabado de aprender naquele momento, mas quando eu subia, por mais que eu me movesse na escuridão das alturas, sempre que descia, eu estava no mesmo lugar, no mesmo corredor. Não havia outra saída, eu teria que tentar percorrer aquele caminho andando e descobrir onde eu poderia chegar.
Esperava, a todo momento, que algo extraordinário acontecesse, numa sequência lógica, após tudo que se sucedeu para mim, até ali. Como num enredo de um filme, ficava espreitando sombras a cada curva, imaginando aranhas gigantes robôs ou bruxos montados em suas vassouras com varinhas flamejantes. Sabia que minha memória trazia elementos que ainda não tinham me abandonado de minha outra vida, que talvez nunca irão me abandonar. Comecei um debate filosófico dentro de minha mente julgando se a criatividade era uma virtude ou um defeito. Se me preparava para qualquer coisa que pudesse ocorrer, sem me surpreender de verdade, ou se me tornava um covarde, temendo coisas que eu não sabia que poderiam sequer existir.
A caminhada chata foi diminuindo minhas expectativas de continuidade infinita de aventura e começava a me cansar. Percebi que não estava mesmo num labirinto pois apesar de idas e vindas, não havia, até então, necessitado tomar decisões sobre o rumo da jornada. Não existia nenhuma bifurcação. O caminho não permitia opções.
Foi então que notei alguém se aproximando, vindo em minha direção. Parei e o desconhecido também parou. Ambos na dúvida sobre continuar ou não o trajeto. Seria ele um fugitivo, também? Esse pensamento me fez continuar. Se fosse um soldado, não teria parado ao me ver. Voltei a andar e o desconhecido também continuou. Ele perguntaria algo ou passaria direto? E se perguntasse? O que eu poderia responder?
Quando me aproximei o bastante para conseguir enxergar, na pouca luz que irradiava de algum astro ou satélite no céu que eu ainda não tinha conseguido ver direito por conta das sombras das árvores, olhei em seu rosto e me assustei. Eu estava encarando um espelho. Aquele desconhecido era exatamente igual a mim e repetia os meus movimentos. Fui me aproximando lentamente e na distância de um passo levei minha mão ao seu ombro, para tentar tocá-lo e ele fez o mesmo em mim. Ambos nos assustamos ao perceber que éramos reais. Perguntei quem era ele e ele fez a mesma pergunta ao mesmo tempo. Já não podia dizer se minha mente me enganava ou se aquilo era alguma armadilha. Tentei continuar em frente, mas aquele meu reflexo não me permitia continuar. Minha ideia foi segurá-lo e girar junto com ele e deu certo. Ficamos de lados opostos e pudemos ficar de costas um para o outro. Fui andando e quando virei para ver se ele fazia o mesmo, ele estava parado no mesmo local, olhando para mim. Continuei meu caminho e ouvi sua voz dizendo, agora já não mais como a minha:
— Parabéns! Eu sou o espírito da floresta e por você não usar de violência e sim resolver um impasse com inteligência e calma, tem o direito de andar por essas matas.
Pena que eu ainda não sabia exatamente pra onde eu estava indo, até que de repente um buraco se abriu aos meus pés e eu estava novamente em queda livre.
Dessa vez a queda me parecia mais estranha. Eu sentia a mesma força intensa de gravidade, mas não estava mais num buraco escuro. Logo reparei que era como se ao meu lado direito houvesse grama, plantas, árvores, como se tudo estivesse na vertical, do lado esquerdo nuvens, animais voadores e algumas estruturas que eu poderia jurar serem ilhas flutuantes. Parecia que minha queda era como uma força me puxando de lado. Aos poucos minha sensação não era mais de queda, mas como se algo estivesse me puxando. Algumas vezes, o cenário que estava de um lado trocava com o de outro, mas não era eu quem tinha virado de ponta-cabeça e sim a floresta.
Num instante, eu podia controlar meus movimentos. Fui movendo meus braços e eles pareciam interferir no ar à minha volta, criava ondas, que levemente giravam meu corpo. Até ali, eu mal conseguia me mexer, parecia que ao tentar, meu corpo era impedido pelo vento. Poém, agora, tentando com mais suavidade, fui notando que apenas os dedos já mudavam algo que era invisível aos meus olhos. Era como uma energia. Se eu estivesse dentro de um videogame eu poderia jurar que já tinha dado a volta em todo o cenário, parecia mesmo com um jogo, era um mundo todo no subsolo de uma floresta, que pela minha sensação era um globo, um circuito que não fazia parte do andar superior, que tinha sua própria luz, mas que não tinha Sol no céu. Posicionando meus pés e minhas mãos, comecei a conseguir me inclinar e criar movimentos perpendiculares. Me aproximava do chão e subia mais aos céus, cada vez mais próximo das árvores, até da grama e cada vez mais alto nas estranhas nuvens. Finalmente meus dedos conseguiram agarrar o tronco de uma árvore e do meu outro braço, que se esticou continuando a ser levado, uma rajada de ar incrível se fez, criando uma clareira no que parecia ser uma grande plantação de algo que parecia trigo. Tomei o controle do meu corpo por um momento e eu parecia flutuar, voar livremente, e novamente eu caí, mas agora a gravidade que me puxou foi a do solo.
A felicidade de ter novamente a liberdade de me mexer e de andar logo foi substituída pela frustração de 360° de horizonte totalmente deserto. Onde eu estava e o mais importante, para onde eu iria agora?
Saga
Universo em Órbita
Ciclo I
Volume 1 – Fúria das Águas
Volume 2 – Jornada do Sangue
Volume 3 – Liberdade do Vento
Volume 4 – Adwig – Rainha Imortal
Volume 5 – Móretar – Poder Humilde
Volume 6 – Athos – Contra o Tempo
Ciclo II
Volume 7 – Shiva e o Desespero Congelante
Volume 8 – Lúcifer e o Sangue Fervente
Volume 9 – Afrodite e a Beleza na Tempestade
Este livro foi impresso pelo Clube de Autores.
Todas as suas informações estão disponíveis online em:
https://www.literunico.com.br/liberdadedovento
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